sábado, 15 de dezembro de 2007




TRADUZIR-SE

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?


Ferreira Gullar

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

ENTRE AMIGOS (12 de abril de 1999)

Para que serve um amigo?

Para rachar a gasolina, emprestar a prancha, recomendar um disco, dar carona pra festa, passar cola, caminhar no shopping, segurar a barra.

Todas as alternativas estão corretas, porém isso não basta para guardar um amigo do lado esquerdo do peito.

Milan Kundera, escritor tcheco, escreveu em seu último livro, "A Identidade", que a amizade é indispensável para o bom funcionamento da memória e para a integridade do próprio eu. Chama os amigos de testemunhas do passado e diz que eles são nosso espelho, que através deles podemos nos olhar.

Vai além: diz que toda amizade é uma aliança contra a adversidade, aliança sem a qual o ser humano ficaria desarmado contra seus inimigos. Verdade verdadeira.

Amigos recentes custam a perceber essa aliança, não valorizam ainda o que está sendo contruído.

São amizades não testadas pelo tempo, não se sabe se enfrentarão com solidez as tempestades ou se serão varridos numa chuva de verão. Veremos.

Um amigo não racha apenas a gasolina: racha lembranças, crises de choro, experiências. Racha a culpa, racha segredos.

Um amigo não empresta apenas a prancha. Empresta o verbo, empresta o ombro, empresta o tempo, empresta o calor e a jaqueta.

Um amigo não recomenda apenas um disco. Recomenda cautela, recomenda um emprego, recomenda um país.

Um amigo não dá carona apenas pra festa. Te leva pro mundo dele, e topa conhecer o teu.

Um amigo não passa apenas cola. Passa contigo um aperto, passa junto o reveillon.

Um amigo não caminha apenas no shopping. Anda em silêncio na dor, entra contigo em campo, sai do fracasso ao teu lado.

Um amigo não segura a barra, apenas. Segura a mão, a ausência, segura uma confissão, segura o tranco, o palavrão, segura o elevador.

Duas dúzias de amigos assim ninguém tem. Se tiver um, amém.


Martha Medeiros

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Eu hoje joguei tanta coisa fora...."

Vou pedir permissão ao autor e repetir a notória frase:
"Eu hoje joguei tanta coisa fora"
Esvaziei minha caixa de e-mail, minha agenda de telefones,
meu coração de "pessoas", que me deixarão saudades...
Deveria ser fácil, como na poesia, mas não é!!!
É doloroso, pois uma caixa limpa,
nada mais é do que uma caixa vazia...
É assim que me sinto!
Não! É assim que não me sinto!!!!

Poema do amigo aprendiz

Quero ser o teu amigo.
Nem demais e nem de menos.
Nem tão longe e nem tão perto.
Na medida mais precisa que eu puder.
Mas amar-te sem medida e ficar na tua vida,
Da maneira mais discreta que eu souber.
Sem tirar-te a liberdade, sem jamais te sufocar.
Sem forçar tua vontade.
Sem falar, quando for hora de calar.
E sem calar, quando for hora de falar.
Nem ausente, nem presente por demais.
Simplesmente, calmamente, ser-te paz.
É bonito ser amigo, mas confesso é tão difícil aprender!
E por isso eu te suplico paciência.
Vou encher este teu rosto de lembranças,
Dá-me tempo, de acertar nossas distâncias...

Fernando Pessoa.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

A vida


Carros a buzinar, faróis a piscar.
Nas ruas pessoas a gritar, bancos lotados.
Trabalhadores estressados.
Restaurantes, onde sequer se pode entrar.

De repente, no meio desse tumulto.
Surge uma personagem importante, com aparência inebriante.
Faz, tal como “magia”, da sua vida vazia,
Tornar-se algo emocionante.


Sentir-se gente e não número ou papel.
Acreditar, que ainda existem estrelas no céu.

Mas, passado o momento da nostalgia.

Sinto doer o “eu” no coração.
Nada do que pensei existia.
E que recorri à infância,

Convivendo no mundo com a imaginação.

Como gostaria de tudo alterar.
De ser uma criatura diferente,

Para nada das pessoas esperar.

Acreditar que fui “gente” e que signifiquei um presente,
Na difícil arte de se encontrar?


E, sentindo o vácuo pelo que idealizei verdadeiro,
Diante de tanta desigualdade.

Não quero me contaminar com realidade,
E, realmente, crer que houve cumplicidade.

Não pense que falo de amor ou de paixão.
Falo de camaradagem, afeto e comiseração.
Falo do Amor sublime, aquele que se sente,
Acima da racionalidade, da convivência e fantasia.
E que existe independente da frustração.

S. B.




segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

"Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina."

Cora Coralina

Ontem foi a prova do Magistério...
Impressionante: a quantidade de professores...
o salário irrisório..., o tumulto..., o lugar...
Enfim, cansativo e preocupante.
Porém, o meu maior prazer foi ver o
primeiro texto da prova:
"Eu sei, mas não devia",
de Cora Coralina.
Confesso que foi um alento e,
mesmo diante daquele "caldeirão",
consegui sorrir de prazer e felicidade.
O texto representava tudo que estávamos
vivendo, inclusive aquele tórrido momento.

O que a arte da poesia é capaz de fazer!!!!!